Mais de 9,4 mil assassinatos, em cinco anos, estão sem solução em Pernambuco
Como se já não bastasse o alto número de assassinatos ano após ano, a impunidade em Pernambuco também é elevada. Estatísticas da Secretaria de Defesa Social (SDS), obtidas pela coluna Ronda JC por meio da Lei de Acesso à Informação, apontam que mais de 9,4 mil investigações de homicídios, instauradas no período de 2017 a 2021, estão sem conclusão no Estado.
Um dos inquéritos é o do assassinato do adolescente pernambucano Arthur Almeida, de 15 anos, que ficou conhecido nacionalmente pela participação no programa musical The Voice Kids, da TV Globo.
O garoto estava em um estabelecimento de serviços estéticos, no bairro de Candeias, Jaboatão dos Guararapes, no Grande Recife, quando foi atingido a tiros, em 30 de abril de 2020.
Segundo testemunhas, era fim de tarde quando um grupo de seis homens invadiu o local. A linha de investigação inicial apontou que os assassinos procuravam pelo cunhado do garoto – um homem que, na época, cumpria pena em regime aberto. Ele conseguiu fugir.
Apesar das dezenas de depoimentos e perícias realizadas, o caso completou dois anos e segue impune. Questionada pela coluna Ronda JC, a assessoria da Polícia Civil informou apenas que o caso “segue em investigação pela 12ª Delegacia de Polícia de Homicídios”.
Em 2020, ano em que Tuca foi assassinado, a SDS somou 3.760 homicídios no Estado. Desse total, 2.413 (64,2%) investigações foram concluídas. Outros 1.347 inquéritos seguem sem solução.
Importante pontuar que, em alguns casos, a polícia encerra a investigação sem conseguir apontar a autoria do crime.
O maior exemplo de impunidade está no ano de 2017, quando houve recorde histórico de assassinatos em Pernambuco. Ao todo, 5.428 pessoas foram mortas. Até hoje, a Polícia Civil só conseguiu concluir 37,15% dos inquéritos instaurados. As famílias de mais de 3,4 mil vítimas da violência continuam, anos depois, aguardando pelo mínimo: a identificação dos possíveis autores para que sejam julgados e punidos.
No Estado, em média 80% dos homicídios são praticados com armas de fogo. A recente adesão do governo de Pernambuco ao Sistema Nacional de Análise Balística, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, pode agilizar a resolução dos casos. A tecnologia faz o cruzamento dos dados das munições apreendidas e identifica se determinada arma foi utilizada em outros crimes.
Outro indicativo da impunidade é que, segundo policiais civis ouvidos em reserva pela coluna, a ordem da chefia é dar prioridade para as investigações dos crimes ocorridos no ano vigente. Isso significa que os inquéritos instaurados em 2022 estão recebendo mais atenção do que os mais antigos.
Em nota, a assessoria da Polícia Civil afirmou que todos os homicídios são investigados com rigor. “A experiência policial demonstra que a agilidade nas diligências, coletas de provas, tomada de depoimentos e outros elementos têm impacto direto na elucidação de crimes, com indicação de autoria. Em muitas ocorrências, a prisão é feita em flagrante. Quando isso não ocorre, os trabalhos prosseguem e a diretriz da instituição, assim como nas demais forças que compõem o Pacto pela Vida, é perseguir sem descanso a elucidação de crimes contra a vida, levando os autores ao sistema de justiça criminal.”
“Falta efetivo para investigar”
O presidente do Sindicato dos Policiais Civis de Pernambuco, Rafael Cavalcanti, afirmou que o alto número de inquéritos de homicídios sem solução é resultado do déficit de profissionais da segurança.
“A criminalidade vem aumentando e faz tempo que o efetivo da Polícia Civil é praticamente a metade do que deveria existir. O próprio Pacto pela Vida afirmava que, em 2015, deveríamos ter 10.500 policiais civis na ativa. Mas, hoje, nós temos 6.300 entre todos os cargos (agentes e comissários)”, pontuou Cavalcanti.
“O policial está adoecendo e não tem assistência da própria instituição. Adoece por causa de assédio, adoece por falta de estrutura, adoece porque ele é removido simplesmente por se negar a fazer coisas que não são competência dele. Temos uma das piores estruturas do País. Delegacias estão caindo aos pedaços. Diante dessa realidade, não poderíamos obter um resultado diferente. Falta efetivo para investigar os crimes”, completou.
Outro inquérito ainda sem solução é o da morte de Victor Kawan Souza da Silva, de 17 anos. Ele e um amigo seguiam de moto por Sítio dos Pintos, na Zona Norte do Recife, quando passaram por policiais militares. Houve uma perseguição e, pouco depois, Victor, que estava na garupa, foi baleado no peito. Ele morreu na UPA da Caxangá.
A Polícia Militar alegou que o tiro foi disparado porque, durante a tentativa de abordagem, os garotos teriam reagido. Mas a família nega e, quase cinco meses depois, ainda aguarda o resultado da investigação. “Até agora a gente não sabe o que de fato aconteceu. Vamos continuar pedindo justiça até que o caso seja resolvido”, disse a mãe da vítima, Janaína Souza. A 5ª Delegacia de Polícia de Homicídios segue investigando o caso.
Em nota, a Polícia Civil afirmou que tem priorizado as investigações de homicídios no Estado. “Ações adotadas em 2017, quando o Estado iniciou a aferição desse indicador, fizeram com que Pernambuco ultrapassasse, nos anos seguintes, a casa dos 64% de resolução. A meta é superar essa taxa a cada ano, reduzindo a impunidade, prevenindo crimes e trazendo conforto às famílias das vítimas”, pontuou a nota.
Por JC Online